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Terapia Manual ou Manipulativa

Terapia Manual ou Manipulativa

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Estudos clínicos e inúmeras experiências de pacientes têm demonstrado a eficácia da Terapia Manual (TM) no tratamento de uma ampla variedade de condições musculoesqueléticas. Além disso, a TM apresenta-se como uma intervenção custo-efetiva quando comparada a outros tratamentos comumente utilizados, sendo raramente associada a complicações graves. De fato, o perfil de risco da TM em relação a eventos adversos é semelhante ao do exercício físico e consideravelmente menor que o da maioria dos medicamentos.

 

A TM também é uma modalidade terapêutica amplamente procurada. Nos Estados Unidos, por exemplo, seu uso manteve-se relativamente estável entre 1999 e 2012. Em um levantamento recente, verificou-se que 8,4% da população geral utilizou técnicas de manipulação articular e 6,9% recorreu à massagem no último ano. Estudos conduzidos por diversos grupos de pesquisa, sugerem que pacientes com dor apresentam altas expectativas de melhora com o uso da TM.

 

As pesquisas já realizadas abordam diferentes distúrbios musculoesqueléticos, como dor lombar, dor no ombro e dor cervical. Tais estudos têm se concentrado principalmente em fornecer evidências diretas sobre os efeitos clínicos da TM, tendo como desfecho primário a redução da dor em repouso e durante a atividade. Os resultados mais consistentes apontam que a TM promove uma modificação na forma como o sistema nervoso percebe e interpreta a dor, reduzindo sua intensidade e desconforto, o que contribui para uma melhora clínica geral. No entanto, permanece a questão: como esses efeitos ocorrem?

 

Os mecanismos responsáveis pelos resultados clínicos observados com a TM ainda não estão totalmente esclarecidos. Compreender esses mecanismos é essencial para identificar e selecionar adequadamente os pacientes que responderão de forma mais favorável ao tratamento. A identificação clara desses processos também contribuiria para maior aceitação e uso apropriado das técnicas de TM entre os profissionais de saúde. Neste contexto, considera-se importante analisar os fatores mediadores e moderadores que influenciam os desfechos clínicos da TM.

 

A eficácia da TM tem sido tradicionalmente explicada pela correção de anormalidades biomecânicas detectadas durante o exame clínico, segundo modelos teóricos específicos. Entre os principais modelos conceituais estão o da “subluxação vertebral”, o da “rigidez ao movimento passivo”, o da “patologia do disco intervertebral” e o dos “pontos gatilho” musculares. De forma semelhante, algumas hipóteses biomecânicas tentam explicar os efeitos da TM utilizando termos como “ruptura de aderências articulares”, “lubrificação tecidual”, “correção de subluxações” e “ajuste”, entre outros.

 

Contudo, muitas dessas teorias biomecânicas carecem de comprovação científica consistente. Embora a TM possa, de fato, gerar movimentos ou tensões nos tecidos sobre os quais é aplicada, estudos recentes indicam que seus efeitos vão além das estruturas locais. Evidências sugerem que a TM pode modificar a interação entre mediadores inflamatórios e receptores de dor periféricos, alterando a concentração de substâncias envolvidas nos processos inflamatórios e dolorosos.

 

A TM também parece atuar no sistema nervoso central, reduzindo a excitabilidade espinhal. Isso é evidenciado pela diminuição imediata de reflexos nociceptivos e da somação temporal sensorial, o que reflete redução da facilitação e aumento da inibição da dor. Revisões sistemáticas demonstram reduções nos limiares de dor à pressão após a aplicação de técnicas direcionadas tanto às articulações quanto aos tecidos musculares e conjuntivos. Embora as implicações clínicas desses efeitos de curto prazo ainda não estejam totalmente estabelecidas, elas oferecem suporte preliminar para mecanismos neurofisiológicos associados à TM.

 

Além disso, foram relatadas alterações na função motora após a aplicação da TM, como supressão da atividade dos neurônios motores, diminuição da atividade muscular em repouso e redução de respostas motoras reflexas. A TM também parece provocar efeitos imediatos em regiões corticais responsáveis pela integração de estímulos sensoriais com áreas cognitivas e emocionais. Estudos em animais demonstraram redução da atividade cortical em resposta a estímulos dolorosos após a mobilização articular.

 

Em humanos, pesquisas utilizando manipulação espinhal evidenciaram redução da atividade cerebral em áreas relacionadas ao processamento da dor logo após a intervenção. Houve ainda correlação significativa entre a menor ativação do córtex insular e a diminuição dos relatos subjetivos de dor, sugerindo a participação de mecanismos supraespinais na analgesia induzida pela TM.

 

Outro estudo, utilizando ressonância magnética funcional, observou alterações imediatas na conectividade funcional entre regiões cerebrais envolvidas na percepção e modulação da dor, após diferentes tipos de TM (manipulação espinhal, mobilização espinhal e toque terapêutico). Todos os métodos resultaram em redução da dor clínica e apresentaram padrões comuns de mudança na conectividade cerebral, sugerindo que os parâmetros mecânicos específicos podem ser menos relevantes do que se imaginava e que um mecanismo central compartilhado pode estar por trás do alívio da dor.

 

A participação dos sistemas supraespinais nos efeitos da TM também é apoiada pela observação de hipoalgesia acompanhada de ativação do sistema nervoso simpático, evidenciada por alterações em frequência cardíaca, pressão arterial, condutância e fluxo sanguíneo cutâneo. Além disso, foram relatadas reduções na variabilidade da frequência cardíaca, nos níveis de amilase salivar, cortisol e insulina, após a aplicação da TM.

 

Os efeitos analgésicos da TM podem ocorrer tanto localmente quanto em regiões distantes do local de aplicação, podendo durar até 24 horas após o tratamento. Em casos de dor persistente, acredita-se que exista um fenômeno de “memória da dor”, no qual o cérebro continua a associar certos movimentos ou estímulos a experiências dolorosas anteriores, mesmo após a recuperação da lesão inicial. Nesse contexto, a TM pode ajudar o sistema nervoso central a criar novas memórias sem dor, ao expor o paciente a estímulos seguros e não ameaçadores, tanto do ponto de vista físico quanto emocional.

 

Assim, a TM atua por meio de mecanismos neurofisiológicos e cognitivo-emocionais, contribuindo para a dessensibilização do sistema nervoso e a reeducação da resposta corporal à dor. Estudos futuros sobre TM devem buscar relacionar de forma mais direta as mudanças neurofisiológicas observadas — como as alterações no sistema nervoso autônomo e nos mecanismos endógenos de modulação da dor — com as queixas clínicas apresentadas pelos pacientes.

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Mitos sobre a Terapia Manual: o que é importante saber

A terapia manual é uma ferramenta valiosa no cuidado da dor e da função corporal, mas ainda existem muitos mitos sobre o que ela realmente faz.

 

Veja o que a ciência mostra:

1. Não há “energia vital” envolvida.
Os efeitos da terapia manual são explicados pela biologia e pela fisiologia, não por forças misteriosas ou energias invisíveis.

2. A terapia manual não é mágica.
Ela não “cura” o corpo de formas inexplicáveis. Seus benefícios vêm de mecanismos conhecidos, como o alívio da dor, melhora da mobilidade e relaxamento muscular.

3. Não trata doenças sistêmicas.
Terapia manual não cura câncer, gripes, asma, autismo, COVID-19 ou outras doenças clínicas. Esses casos devem ser acompanhados por médicos especializados.

4. Ajustes regulares não previnem doenças ou dores.

Não há evidências de que manipulações frequentes evitem problemas futuros. A terapia manual deve ser indicada conforme necessidade clínica.

5. As articulações não são “recolocadas no lugar ou ajustadas”.
Apesar de pequenas mudanças no movimento articular poderem ocorrer, não há provas de que isso determine o sucesso do tratamento.

6. Nenhuma técnica é superior à outra.
Estudos mostram que diferentes métodos de terapia manual têm resultados semelhantes. O importante é a habilidade do profissional e a adequação ao paciente.

7. Experiência não é “poder de cura”.
Profissionais experientes se destacam por compreender melhor o paciente e adaptar o tratamento — não por terem “poderes” especiais.

8. Não existe uma única forma correta de aplicar.
Cada técnica pode ser ajustada conforme a necessidade e o conforto do paciente. O foco deve estar nos resultados clínicos, não na forma exata da execução.

 

Em resumo:
A terapia manual é eficaz quando usada com base científica e integrada a outros cuidados de saúde. Ela não substitui tratamentos médicos, mas pode ser uma grande aliada na melhora da dor, mobilidade e qualidade de vida.

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